terça-feira, 19 de outubro de 2010

O mito de Sísifo (ou Orfeu e Eurídice)

É hora de fechar este blog: eu não sei mais escrever.

Ontem cheguei ao fundo do poço. No começo do dia encarei o abismo por longos minutos, decidindo se dava um passo à frente ou não, depois vaguei o dia todo a pé sem rumo, sem lugar para ir e sem praticamente falar com qualquer pessoa, só para terminar o dia muito cansado.

Na verdade, dizer que eu estava muito cansado é pouco. Em minha sala de trabalho há um gaveteiro móvel pequeno, de três gavetas; apaguei as luzes da sala e da frente dela, movi o gaveteiro alguns centímetros e deitei no chão, entre ele e a parede, pateticamente escondido do mundo. Oito de cada dez pensamentos meus eram realmente deprimentes e os outros dois não significavam nada. Dormi sentindo o frio do chão e balbuciando qualquer coisa, tendo comido durante o dia todo um cookie, um Polenguinho, um copo de suco de laranja, um café, uma esfirra, mais um café e duas bolachas.

E hoje às seis da manhã eu estava de pé de novo. Para quê?

Estou acabado, e acho que este blog deve também acabar: assim seja.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O náufrago

Trecho que encontrei num blog por aí:
"we are all alone, born alone, die alone, and — in spite of True Romance magazines — we shall all someday look back on our lives and see that, in spite of our company, we were alone the whole way. I do not say lonely — at least, not all the time — but essentially, and finally, alone. This is what makes your self-respect so important, and I don’t see how you can respect yourself if you must look in the hearts and minds of others for your happiness."
Tá bom, mas ninguém nasce sozinho: todo mundo que nasceu esteve até o instante do nascimento ligado por um cordão umbilical a outra pessoa. E ninguém vive sozinho: tente viver sozinho mesmo - sem ler ou ver ou usar algo que outra pessoa fez - e você vai ver o quão acompanhado estamos.

A solidão não é um fato por si só: somos ilhas, mas ao nosso redor há um oceano repleto de outras ilhas, e elas interagem umas com as outras, às vezes mais, às vezes menos.

Enfim, esse texto me capturou por eu ter passado o dia de hoje quase inteiramente sozinho, falando comigo mesmo e praticamente ninguém, tal como o personagem de Tom Hanks... 

That joke isn't funny anymore

Pelos últimos três dias tenho sido assombrado por uma música, que toca sem parar dentro de mim, imprecisa e incompleta como qualquer memória, mas mesmo assim insistente, permanente e pungente.

Fui ao YouTube descobrir que música era, e depois de um pouco de pesquisa, encontrei. Assim que a ouvi sofri um baque, com calafrios, dor no peito e tudo mais que deve acontecer quando se vê um fantasma. A letra, que eu não lembrava, que devo ter conhecido há muitos anos, fala quase que exatamente para mim... É fantástico como o cérebro tem capacidades imensas, em geral ignoradas ou adormecidas.

De qualquer modo, é o refrão que me assombra: "I've seen this happen in other people's lives, now it's happening in mine."

sábado, 9 de outubro de 2010

O turista acidental


Às vezes, quando eu não quero mais trabalhar, saio por aí, mesmo que seja sentado em frente ao computador. Às vezes, encontro gente e lugares interessantes, e às vezes não.

Mas foi assim que encontrei uma entrevista do cartunista Laerte em que ele aparece vestido de forma não convencional, lembrando muito a irmã dele(que eu acho que vi em algum documentário) e um personagem de seus quadrinhos (que eu acompanho regularmente há anos).

Me surpreendeu também o blog onde encontrei isso, não pelo blog, mas pelo perfil da autora, que tem Flickr, Orkut, Facebook, e sei lá o que mais (incluindo uma "curiosa" lista de desejos): não sei se eu me exporia desse jeito, ou o que isso quer dizer sobre a moça, mas vejo nisso um sinal desses nossos tempos - o mundo com pessoas de todo tipo (e de todo tipo de vestuário) está na ponta dos nossos dedos, pronto a alcançar nossos olhos.

(imagem: o título desta postagem tem a ver com o que eu escrevi e também com o nome de uma das personagens do filme de onde ele, título, saiu...)

Drive

Há uma música do grupo REM que eu queria colocar aqui, mas que o YouTube não permite incorporar facilmente. Fica o link, e um pedaço da letra (sem tradução):
"Hey kids, rock and roll
Nobody tells you where to go, baby

What if I ride? What if you walk?
What if you rock around the clock?
Tick-tock, tick-tock
What if you did? What if you walk?
What if you tried to get off, baby?

Hey kids, where are you?
Nobody tells you what to do, baby"
E essa postagem vai sem imagem nenhuma mesmo.

Publicar e perecer


A relatividade geral, teoria elaborada por Albert Einstein, está prestes a fazer cem anos. Quase cem anos, e eu ainda a estudo com admiração.

É bastante possível que em cinquenta anos eu esteja morto. E que daqui a cem anos estejam mortos os que tiveram lembranças de mim. Antes de tudo isso, porém, o mais provável é que tudo que eu escrevi - poemas, textos soltos, este blog, artigos científicos - já tenha sido esquecido e apagado.

Na academia, o lema é publicar ou perecer: e assim pilhas de palavras, gráficos e equações são produzidas apenas para aumentar a quantidade das coisas que irão, rapidamente, para o lixo da história, inflando por algum tempo o ego e a reputação local de alguns. Meus colegas cientistas contemporâneos são todos mais produtivos e de maior reputação científica que eu. No entanto, duvido que daqui a cem anos algo que algum deles - e que eu - tenha publicado até hoje venha a ser lembrado...

Pois é, não quero entender como tanta energia pode ser gasta em tanto trabalho vazio: acho mesmo que eu já deveria estar no lixo. Só que, enquanto isso não acontece, irracionalmente continuo produzindo textos vazios como estes.

(imagem: as árvores produzem folhas, elas caem ao solo e novas crescem para que a árvore sobreviva e cresça - será assim a ciência? O título desta postagem vem de um livro onde há um personagem que, à beira da morte, pensa: "This can't be happening to me. I've got tenure.")

sábado, 2 de outubro de 2010

Política


Amanhã é dia de eleição para presidente, senador, governador, deputado federal e deputado estadual.
Eu prefiro ciência, eu prefiro poesia, eu prefiro amor, mas não posso esquecer da política. Fui eleito um punhado de vezes, para um punhado de coisas: representante dos estudantes aqui, membro do centro acadêmico ali, representante dos docentes, vice-diretor - sempre eleito, nunca indicado.

É, eu prefiro ciência e poesia, mas não posso mesmo esquecer da política. É por meio da política que se pode ajudar a construir um mundo com mais ciência e poesia. Sem pão, até dá para escrever uns artigos, ter idéias, sonhar; mas é muito mais fácil fazer isso de barriga cheia. E é a política que direciona o caminho de uma sociedade, indicando quem, na sociedade, vai receber mais ou menos pão.

Eu sonho com uma sociedade em que o pão abunde, sobre, em que não sejam necessários milagres que transformem uns poucos pães em alimento para uma multidão, uma sociedade em que todos, conhecendo a ciência, não esperem milagres, mas em que as multidões leiam e façam ciência e poesia. Eu sonho, irrealmente, com uma sociedade cheia de pão, ciência e poesia.

É claro que a realidade não está nem aí para com os meus sonhos. Eu é que tenho que ver, na realidade, como fazer meus sonhos frutificarem, ou pelo menos como fazer algo que aproxime a realidade de meus ideais. E isso não é uma tarefa fácil: o mundo real, especialmente o da política, parece não ter nada de ciência e poesia.

Só que eu sei que há poesia em muitos lugares: por que ela não estaria na política também?

Dos candidatos que se apresentam a presidente, onde está a poesia, onde a chance de uma melhor distribuição de pão, onde o apoio à ciência? Para mim, a resposta é clara: eu voto no partido da borboleta, da estrela, do sonho que é possível.

Pois é, eu, amanhã, vou votar a favor de muita coisa, mas também contra outras coisas, contra o preconceito, contra a "tradição", contra o elitismo, contra o medo, contra quem quer "salvar o Brasil", contra modismos: eu quero mais é voar e permitir que todos, independente da instrução e da renda, voem também, em direção às estrelas e aos sonhos. Pão, paz e sonho para todos, se não hoje, ou amanhã, nalgum dia, a partir das sementes plantadas agora.

Eu não tenho mesmo medo de ser feliz, e queria que todos fossem...

(imagem: meu sangue é vermelho, como algumas regiões do céu, como algumas estrelas, e não azul, pois não há ninguém de sangue azul, tanto como não existem, na natureza, tucanos azuis; em política, tradicionalmente o vermelho é a cor da esquerda e o azul da direita, em ligação com a revolução francesa: havia quem defendia o povo, de sangue vermelho, e havia quem defendia a nobreza, o sangue azul - "Eu estou do lado do bem. E você de que lado está?")