sábado, 27 de fevereiro de 2010

Os problemas do milênio


Li, certa vez, um livrinho interessante chamado "Os problemas do milênio", de Keith Devlin, que, num site de comércio eletrônico, aparece com a seguinte resenha:
"Em maio de 2000, o Clay Mathematics Institute (CMI) - ONG norte-americana que desenvolve e dissemina conhecimentos matemáticos - ofereceu sete prêmios no valor de um milhão de dólares cada. Para receber a bolada, basta solucionar um dos problemas de matemática propostos. Mas a riqueza não vem fácil: os problemas são considerados por um comitê de matemáticos como os mais complicados e mais importantes desta área em nossos dias. O anúncio causou rebuliço e manteve a mídia interessada desde então. OS PROBLEMAS DO MILÊNIO, do matemático e escritor Keith Devlin, fornece embasamento para cada um dos problemas, descreve como surgiram, o que torna cada um deles particularmente difícil e tenta esclarecer por que os matemáticos os consideram tão importantes."
Bem, esse tipo de prêmio de um milhão de dólares não é tão incomum no exterior. Há, por exemplo, o
"One Million Dollar Paranormal Challenge (Desafio Paranormal de Um Milhão de Dólares), no qual a James Randi Educational Foundation pagará um milhão de dólares a qualquer um que demonstrar evidência de evento paranormalsobrenatural ou de poderes ocultos."
Tais prêmios foram criados como incentivos: os prêmios do Clay Institute visam incentivar o estudo de problemas matemáticos, e o prêmio da James Randi Foundation parece incentivar a idéia de que não existem pessoas com poderes paranormais (se existem paranormais mesmo, eles devem ser muito desapegados aos bens materiais, já que nenhum deles quis o prêmio, que não foi pago até hoje...).

No Brasil moderno temos também um famoso prêmio de um milhão de reais, dado pelo programa de TV "Big Brother Brasil", patrocinado provavelmente por empresas e por ligações telefônicas do público (estou chutando: nunca assisti cinco minutos desse negócio, que é isso mesmo - um belo negócio). Eu só me escuso de dizer o que ele incentiva...

(imagem: Ignorância e Miséria, os problemas do milênio, na visão de uma das edições de "Um conto de Natal", de Charles Dickens - sabe, aquela estória do velhinho que é visitado pelo espíritos na noite de Natal...)

Como educar meu filho?


A Folha de São Paulo, jornal que eu assino, tem um caderno semanal chamado "Equilíbrio", em que uma psicóloga, Rosely Sayão, escreve uma coluna. Na coluna do dia 25 de fevereiro achei o seguinte trecho, destacado pelo jornal:
"... a classe média não se importa com as políticas públicas em educação e a imprensa se ocupa mais com o que acontece nas escolas privadas ..."
A mulher descobriu a roda. Será que o grosso dos leitores da Folha, de classe média para cima, conservadores até o talo (eu diria até mesmo que são direitistas ou fascistas que ainda não saíram do armário), entendeu a mensagem?

Há, hoje, no Brasil, um partido político que representa a classe média. E adivinha como é o ensino público apregoado por esse partido? Sabe qual é o valor que esse partido, cheio da ideologia burguesa, dá aos professores das escolas públicas, ou aos servidores e serviços públicos em geral? Esmola para o povo, pois a classe média, por sua pujança econômica, pode se virar muito bem. Só quem tem grana merece viver bem, e o resto que coma as migalhas do banquete: essa é a idéia geral desse pessoal que, se pudesse, separava o Brasil de São Paulo...

Nada disso é novo. Faz tempo que o homem é o lobo do homem: ao vencedor as batatas!

(imagem: uma boa educação é coisa para as elites...)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O estrangeiro


Tem uma citação que não posso deixar de fazer:
"Um amigo meu saiu maravilhado depois de assistir a Avatar. Não parava de falar das montanhas flutuantes. E eu disse a ele: ‘Cara, seu planeta tem montanhas gigantescas de água. De água. Que flutuam em cima da sua cabeça todos os dias e quando viram chuva contribuem para o ciclo do líquido mais importante da sua existência’. A maioria vai de um lugar para o outro sem se dar conta da complexidade, maravilha e encantamento que é uma nuvem"

Ibrahim César, no 1001 Gatos de Schrödinger
Não posso deixar de fazer, por me fazer lembrar de outra coisa:
"- De quem gostas mais?, diz lá, estrangeiro.
De teu pai, de tua mãe, de tua irmã ou do teu irmão?
- Não tenho pai, nem mãe, nem irmãos.
- Dos teus amigos?
- Eis uma palavra cujo sentido sempre ignorei.
- Da tua pátria?
- Não sei onde está situada.
- Da beleza?
- Amá-la-ia de boa vontade se a encontrasse.
- Do ouro?
- Odeio-o tanto quanto vós a Deus.
- Então que amas tu singular estrangeiro?
- Amo as nuvens... as nuvens que passam... as maravilhosas nuvens!"

Charles Baudelaire, em "O estrangeiro"
A maioria, caro Ibrahim César, é como as nuvens: vão de um lugar para o outro, sem consciência, ao sabor dos ventos, e sem perceber a beleza da paisagem.

(imagem: nuvens, vistas por cima, na Wikipédia)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Watchmen

Esta postagem é para quem gosta de quadrinhos e sabe inglês: vale a pena...



"All we ever see of stars are their old photographs..." Não é verdade apenas para as estrelas: o mundo é uma coleção de fotografias, bidimensionais, amarelando rápido.

A república


Não, o mundo, para mim, não é feito de sombras numa caverna, como no mito divulgado pelo filósofo grego Platão. Para haver sombras, é necessário que haja luz, em alguma parte - e não é isso que eu vejo: as pessoas não são projeções, sobre uma superfície, de algo iluminado. Para mim, de onde estou, simplesmente as pessoas não são.

Ou são ilusões: todos são ilusões. Ilusões que podem me prejudicar, me ferir, se quiserem, mas apenas por uma questão de proximidade física, que não se traduz em nada mais. O mundo, meu mundo, é feito de nuvens e névoas, de desertos e miragens, de incríveis perdas de tempo. O mundo é como os milhares de canais da TV: muito pouco se aproveita.

Inércia, consciência, responsabilidades, só isso me mantém onde estou. Se pudesse, não estaria. Iria para Marte, como o Doutor Manhattan, de Watchmen, ou para alguma ilha do Pacífico, como Gauguin, ou...

Não interessa, eu sei. Não faz a menor diferença que eu não esteja aqui. Nada faz a menor diferença: aos vencedores, as batatas, "and the rest is silence".

(imagem: outro mundo)

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

The american religion


Havia um problema na minha família que precisava de uma solução urgente - eu sugeri uma maneira de resolvê-lo, pedindo que se evitasse uma outra determinada solução, pois essa outra solução poderia ter alguns inconvenientes. Pois bem, a decisão da família foi fazer justamente do modo que eu pedi para ser evitado. Conclusão: hoje, às oito da manhã, fui acordado por um telefonema que informava que os inconvenientes que eu previ se realizaram.

Eu tive uma namorada que me disse que se alguém a avisasse que ela deveria frear para não bater na parede, aí é que ela iria acelerar.

Pois é, ninguém gosta de admitir que pode estar errado. Mesmo quando o erro aparece, as pessoas sempre encontram justificativas e explicações que dizem que não foi bem assim, que elas não erraram, que não houve erro.

Um exemplo histórico, pouco conhecido dos brasileiros, diz respeito ao fim do mundo. Na segunda metade do século XIX, quando a teoria da evolução, de Charles Darwin, foi lançada, ficou claro para os cientistas que, se a teoria estivesse certa, a Terra, nosso planeta, deveria ter uma idade muito maior do que a que se supunha até então, para que a vida houvesse tido tempo de evoluir, num processo naturalmente lento, de formas simples até formas mais complexas como as que vemos hoje.

Na época, uma idéia bastante difundida entre as pessoas é de que o mundo era jovem, com poucos milhares de anos. Várias estimativas da idade da Terra foram feitas tendo por base a Bíblia (inclusive por Isaac Newton) e todas elas davam como certo que a Terra seria muito jovem.

A mais famosa dessas estimativas foi pelo pelo arcebispo irlandês James Ussher, que chegou a estabelecer que a Terra teria sido criada no anoitecer do dia 23 de outubro do ano 4004 antes de Cristo, e com base numa dessas estimativas, propagada por um sujeito chamado William Miller, milhares de cristãos estadunidenses ficaram esperando o início do fim do mundo, com a segunda vinda de Jesus Cristo, para o dia 22 de outubro de 1844, num episódio que ficou conhecido como o Grande Desapontamento (essa história é contada, por exemplo, por Harold Bloom, no livro "The american religion").

Aparentemente, Cristo não veio, pelo menos do jeito que era esperado. É claro, porém, que logo se descobriu que não foi Cristo que não veio: as pessoas é que não viram Cristo. Eis o que diz a wikipedia:
"Eles se convenceram que a profecia bíblica previa não o retorno de Jesus à Terra em 1844, mas que Ele começaria naquela data um ministério especial no céu (juízo investigativo)."
É interessante o que aconteceu com um certo grupo:
"Miller baseou seus estudos da volta de Jesus em 1844 numa crença popular que dizia na época que "a terra era o santuário". Quando ele interpretou no livro de Daniel "purificação do santuário" seria a purificação da terra. Os Adventistas (que mais tarde originou os Adventistas do Sétimo Dia) ao re-estudarem as profecias, verificaram que o santuário a que se referia o livro de Daniel era o Santuário Celestial, pois quando Moisés iniciou a contrução do santuário com o povo de Israel ao saírem da escravidão do Egito, Deus lhes mostrou um modelo que era cópia do verdadeiro santuário. Vide os textos: "Conforme a tudo o que eu te mostrar para modelo do tabernáculo, e para modelo de todos os seus pertences, assim mesmo o fareis... Atenta, pois, que o faças conforme ao seu modelo, que te foi mostrado no monte." Êxodo 25:9, 40; "ORA, a suma do que temos dito é que temos um sumo sacerdote tal, que está assentado nos céus à destra do trono da majestade, Ministro do santuário, e do verdadeiro tabernáculo, o qual o Senhor fundou, e não o homem." Hebreus 8:1-2; "Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu, para agora comparecer por nós perante a face de Deus." Hebreus 9:24. Do pequeno grupo que se recusou a desistir depois do "grande desapontamento" surgiram vários líderes que construíram a base do que viria a ser a Igreja Adventista do Sétimo Dia e deu origem à interpretação da profecia já citada."
Enfim, dizem que num casamento há duas partes envolvidas: uma que sempre está certa e o marido. Por uma questão de nascimento e genética, eu só posso ser o marido...

(imagem: segundo alguns estudiosos, que devem ser os únicos capazes de interpretar corretamente o calendário maia, o mundo acaba em 2012 - se cuida!)

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Cem anos de solidão


A revista Scientific American Brasil traz sempre uma coluna chamada "50, 100 & 150 anos de memória", e neste mês há a seguinte informação, vinda lá de fevereiro de 1910:
"A inundação de Paris fez com que muitas das ruas da metrópole ficassem tão navegáveis quanto os canais de Veneza."
Imediatamente, me lembrei de ter lido muito recentemente algo, acho que na Folha de São Paulo, com um título como "Benvindo aos anos 50!", em que se argumentava que só agora os padrões brasileiros de consumo ou renda estariam se igualando aos padrões estadunidenses dos anos 50. Pois bem, acho que em São Paulo o tempo é outro: estamos muito no passado, mesmo.

Só para fazer outra comparação, dá para encontrar na wikipedia, no verbete "Metro da Cidade do México", que "a primeira linha do metro servia 16 estações e foi aberta ao público em 1969. Desde então foram efectuadas várias expansões sucessivas à rede; actualmente é composta por 11 linhas, 175 estações e 177 km de linhas." Quantos quilômetros tem o metrô de São Paulo? A wikipedia também responde: "a malha de metropolitano de São Paulo possui 62,3 km e 56 estações"...

(imagem: metrô é isso, não o que eu tenho lá em casa...)

Ether, OR


Quando mais jovem eu andava muito de ônibus e trem e metrô, para lá e para cá. Para aproveitar o tempo sempre carregava comigo alguma coisa para ler. Li muito assim. Uma das coisas que eu li, além da literatura "universal" clássica, era ficção científica. Eu tenho a coleção completa de uma revista de ficção científica, de vida curta, em português, chamada "Isaac Asimov Magazine". Eu comprava também a versão em inglês da revista, quando podia.

Mês passado comprei uma coletânea comemorativa de 30 anos da revista americana, em que há um conto sobre uma cidade que não tem localização fixa, "Ether, OR", de Ursula K. Le Guin, e onde encontrei o seguinte trecho (minha tradução):
"Eu nunca questionei, eu estava tão ocupada com as respostas, mas faço sessenta anos neste inverno e penso que devo ter tempo para uma pergunta. Mas é difícil fazê-la. Aqui está ela. É como se em todo o tempo em que eu estive trabalhando cuidando da casa e cuidando das crianças e fazendo amor e nos mantendo eu pensasse que haveria um tempo ou que haveria um lugar onde tudo fizesse sentido. Como se fossem palavras que eu estivesse dizendo, toda minha vida, em todos os tipos de trabalho, apenas uma palavra aqui e outra ali, mas finalmente todas as palavras formariam uma frase, e eu poderia ler a frase. Eu teria feito minha alma e saberia para quê.
Mas eu fiz minha alma e eu não sei o que fazer com ela. Quem a quer?"
Isso é um trecho de um conto de ficção científica, um gênero menor da literatura? Não! Isso é uma das melhores descrições da vida comum que eu já vi. E eu já li muito, muito mesmo. Mas devo estar velho: talvez por isso esse trecho, em particular, tenha me tocado muito.

Talvez também eu já tenha falado palavras demais esperando que elas façam sentido, mas não sei se fazem.

(imagem: Monte Hood, o ponto mais alto do estado do Oregon - abreviação OR - com seus 3 426 metros de altitude.)

Escolha a catástrofe


Muitas coisas acontecem todo dia, e algumas ou são boas ou acontecem em silêncio, sem estardalhaço e, portanto, são inúteis para a imprensa e o cinema americano.

De qualquer forma, é bom saber que há tragédias que, mesmo sendo tragédias, a imprensa nunca vai registrar, por ter outros interesses. Saiu do ar, quase de fininho, quase que de repente, o Hermenauta. É uma perda, enorme, talvez irreparável, para o debate público brasileiro. E a imprensa não vai dizer nada, absolutamente nada, sobre isso. Digo eu: eu estou de luto. Este blog está de luto, e provavelmente vai ficar assim por muito tempo.

Catástrofe maior que essa, para mim, talvez só a eleição de um careca para presidente.

(imagem: para quem não sabe, o título dessa postagem vem de um livro de Isaac Asimov)

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Fahrenheit 451 (2)


Numa livraria, entre dezenas de prateleiras, encontrei perdido, numa edição bem pequena, em formato de um livrinho de uns poucos reais, "Fahrenheit 451", de Ray Bradbury. É um livro de ficção científica, lançado em 1953, e essa edição, de 2009, traz na contracapa, como informação sobre o livro, apenas o seguinte trecho:
" - A escolaridade é abreviada, a disciplina relaxada, as filosofias, as histórias e as línguas são abolidas, gramática e ortografia pouco a pouco negligenciadas, e, por fim, quase totalmente ignoradas. A vida é imediata, o emprego é o que conta, o prazer está por toda parte depois do trabalho. Por que aprender alguma coisa além de apertar botões, acionar interruptores, ajustar parafusos e porcas?"
Por pura coincidência, hoje de manhã li na seção de cartas da Folha de São Paulo, o seguinte texto, assinado por Oscar Hipólito, ex-diretor do IFSC-USP:
"A precariedade demonstrada por alunos do ensino fundamental, em recorrentes avaliações de português e matemática, mostra claramente que as medidas anunciadas ao longo de anos a fio, se foram ou estão sendo tomadas, não têm surtido efeito."
E a cada dia que eu vou ao portal do Yahoo para ler meus e-mails, encontro notícias do Big Brother Brasil 10, ou notícias sobre futebol ou ...

Na página 136 de meu livrinho de uns poucos reais, há um diálogo curto:
"- Este programa não é sensacional? - gritou Mildred.
- Sensacional!"
(imagem: o futuro ... já chegou)

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Oracular Spectacular

Hoje, fui com uns amigos ao centro velho de São Paulo, começando pela Liberdade. Horas depois, nas Grandes Galerias, por entre multidões de garotos, fui buscar um CD: "MGMT? Nunca ouvi falar!". Quando eu já estava cansado, quem me salvou foi a Baratos Afins.



Terminamos o dia visitando a basílica do Mosteiro de São Bento, com inscrições em latim e tudo o mais.

"I'm feelin rough I'm feelin raw
I'm in the prime of my life
Let's make some music make some money
Find some models for wives"

(vídeo: no site amazon.com pode-se ler que "The term Oracular Spectacular might not mean much, if anything, at all - it's essentially nonsensical - but that doesn't stop it feeling exactly right." É isso mesmo: eu não preciso fazer sentido, só preciso ser.)

Instants de vie


Eu tenho andado deprimido. Sei lá, acho que estou ficando velho, e vejo que nem por isso estou um pouco mais próximo do que eu queria. O que eu queria? Nem sei mais...

Foi assim, nesse estado de espírito, sem conseguir me concentrar, que eu saí mais cedo de meu trabalho um dia desses. No estacionamento, peguei o carro e fui dar a volta no quarteirão para poder pegar a avenida principal. Havia sol, e a rua, de paralelepípedos, ladeada pelos muros do local onde eu trabalho, estava quase vazia, com um ou dois ônibus estacionados.

De repente, sem que eu tivesse tempo para ver de onde, um beija-flor apareceu. Ele parou bem no meio da rua, bem na minha frente, na altura do meu carro, entre duas árvores, flutuando sobre os paralelepípedos, na sombra, bloqueando meu caminho para a avenida, que eu já via bem à frente. Ficou segundos me olhando, hipnotizados eu e ele, e se foi do mesmo jeito que veio.

Pois bem, rememorando o que eu vi, vejo que não era apenas a tarde de mais um dia sem graça, era um dia em que a rua em que caminho sempre se tornou algo diferente, não era um beija-flor, era um anjo com uma espada de fogo, me lembrando que o paraíso e a graça existem, e são como fogos de artifício, brilhando por um instante contra um céu assustadoramente eterno.

Há milagres, eu sei, eu sempre soube, eu morrerei sabendo: há milagres, e eles podem cruzar o caminho de pecadores deprimidos como eu, só para nos lembrar de que somos apenas pecadores deprimidos.

(imagem: o título dessa postagem vem de um livrinho em francês que eu ganhei, de escritos autobiográficos da escritora Virginia Woolf, sobre o qual a wikipedia em inglês diz "As described by Woolf, 'moments of being' are moments in which an individual experiences a sense of reality, in contrast to the states of 'non-being' that dominate most of an individual's conscious life, in which they are separated from reality by a protective covering. Moments of being could be a result of instances of shock, discovery or revelation." [Como descritos por Woolf, "momentos de existência" são momentos em que um indivíduo experimenta um sentido de realidade, em contraste aos estados de não-existência que dominam a maior parte da vida consciente de um indivíduo, no sentido em que eles estão separados da realidade por uma camada protetora. Momentos de existência podem ser o resultado de instantes de choque, descoberta ou revelação].)

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Viagem ao centro da Terra


Ontem, eu estava me sentindo uma porcaria de ser humano. Para lá de deprimido, desconfortável com a minha existência, praticamente suicida, realmente achando a morte uma boa saída, me sentindo menos que lixo. Então, fui almoçar numa lanchonete de fast food.

O folhetinho que forrava a bandeja tinha várias ilustrações sob o tema "Acontece bem debaixo dos seus pés". Numa delas, aparecia um gaúcho num riquixá, e um texto ao lado dizia:

"Imagine cavar um túnel de uns 20 mil km, em linha reta, passando pelo centro da Terra. Se você começar em Porto Alegre, vai terminar na China. Imaginou?"

Hum, não dá para imaginar, mesmo. A Terra é mais ou menos uma esfera de 6400 km de raio (tá lá na wikipedia, pode checar; se não acreditar, pode verificar no site do Wolfram também). Ou seja, um túnel de um lado a outro da Terra, em linha reta, passando pelo centro, teria no máximo 12 a 13 mil quilômetros. Acho que o pessoal que fez o folheto confundiu circunferência da Terra no equador (se você der uma volta completa na Terra, acompanhando a linha do equador, você vai andar uns 40.000 km) com diâmetro da Terra... Os gregos, uns dois mil anos atrás, já sabiam mais.

Não dava para deixar passar um erro desses bem debaixo do meu nariz.

Update: aparentemente o folheto não é novo pois achei uma menção a ele numa postagem antiga de um blog que eu não conhecia; se isso for verdade, é espantoso que ninguém tenha visto o erro.

(imagem: medida do tamanho da Terra por Eratóstenes, por volta do ano 200 antes de Cristo)