quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Frankenstein

1. Lendo "Freakonomics", lembrei de que as pessoas, em geral, não querem ouvir a verdade: querem ouvir o que lhes agrada, o que é mais bonito. Nenhuma mulher quer ouvir do namorado que 'embora ela seja feia (ou gorda), ele a ama' - todas querem ouvir que são lindas.

2. Lâminas de barbear não são novidade, mesmo sendo apresentadas num documentário da TV paga como 'Maravilhas Modernas'. Aparentemente, os homens pré-históricos já se barbeavam com lâminas de pedra. E isso era fundamental para serem escolhidos pelas fêmeas: a ausência de pelos os tornava menos propensos a terem parasitas como piolhos e pulgas e, portanto, eles eram mais saudáveis, o que os fazia serem 'bons partidos'. Ainda hoje esse viés da escolha feminina existe: homens sem barba são os mais preferidos. Pelo menos é isso que dizia o documentário.

3. Li hoje uma notícia que dizia que, segundo o perfil impresso numa moeda antiga, Cleópatra não era tão bela quanto Elizabeth Taylor. Mas certamente ela devia ter seu charme: Cleópatra seduziu dois romanos importante em seguida. Moral? Os homens nem sempre são atraídos pelo valor de face de uma mulher.

4. A informação contrastante vem de "Freakonomics": "De todas as receitas para se dar mal em um site de encontros, deixar de juntar uma foto certamente é a mais infalível..." O que isso significa? Julgamos pela aparência?

5. Fiquei frustrado pela inexistência de uma foto no perfil do Orkut de uma colega: eu queria saber como ela está. No entanto, ela nunca colocou essa foto no site. Qual o motivo para ela se esconder?

6. Eu vivo quase sempre com a barba por fazer, o cabelo grande demais, desregrado. Nunca quis colocar aparelhos ortodônticos. Tenho meus dentes tortos por acidentes com bicicletas na infância, por defeitos de fabricação (minha mandíbula é pequena). Meus olhos são defeituosos e eu, há muito, desisti de usar lentes de contato. Sou o retrato do desleixo e, portanto, posso ser considerado feio. Sou feio. Mas quanto? Quanto disso é natural e o quanto disso é proposital, ainda que mesmo inconsciente? Quanto de mim é feiúra intrínseca, irrecuperável, monstruosidade? E quanto é apenas máscara e desejo de se esconder, auto-punição e auto-piedade? Contudo, eu quero crer que tenho alguma beleza: onde?

7. Uma vez, há muitos anos, fui abordado na Avenida Paulista por uma entrevistadora do Datafolha, que queria saber qual o último livro que eu tinha lido, qual o meu livro preferido. Eu já li tantos livros que nem sei quantos. Impossível dizer um único que seja o melhor. No entanto, ao olhar para a mocinha bem nascida com ares de estagiária e compará-la comigo, me lembrei de imediato de um nome: "Frankenstein", de Mary Shelley. Naquele instante o adotei: meu livro, meu retrato, um livro clássico escrito por uma mulher, quando a esmagadora maioria dos autores clássicos é homem. A visão de uma mulher, romântica, do que é um cientista e dos frutos da ciência. Uma visão de mim.

8. Não sei o que é a beleza. Não sei quem sou. Não reconheço minha foto. Por isso decidi me mapear, pedaço por pedaço, até completar a decrição da ilha que sou. No entanto, não sei se sou competente para tanto: esse é trabalho para um geógrafo, e eu estou mais para um astrônomo...

Um comentário:

Rafael Marcelino disse...

hum hom hum!
não imaginava que gostasse da arte da escrita!!!