quinta-feira, 23 de outubro de 2008

O poder do mito


Há explicações que parecem fazer todo o sentido, sem as quais as coisas parecem caóticas, confusas demais. Religiões funcionam assim, tentando dar consistência ao mundo.

Exemplo: o que leva um rapaz a seqüestrar e manter sob cárcere privado uma moça que ele diz que ama? Loucura é a resposta óbvia. Mas aí surge outro fato: o pai da moça é um foragido, procurado por assassinatos distantes. Parece castigo! Melhor: uma alma prejudicada pelo pai da moça, sedenta por vingança, mas incapaz de agir diretamente no mundo material, descobre o rapaz e o influencia, como um demônio, até que ele mate a menina: a vingança está feita. E tudo faz sentido, os fatos desconexos ligados por uma teoria unificadora.

A teoria? Chama-se espiritismo, e é filha de uma época - fins do século XIX - em que tudo parecia explicável. A vida? Teoria da evolução! A história? Marxismo! O mundo? Física clássica: mecânica, termodinâmica e, acima de tudo, o eletromagnetismo. Enfim, ordem e progresso! Faltava apenas a síntese das religiões e ela veio, atendendo ao chamado do espírito da época (o famoso zeitgeist).

Não, não sou espírita. O espiritismo é só mais uma religião, cheia de dogmas e furos como todas as outras. Não acredito em revelações: em geral, elas são ouro de tolo a brilhar sob a luz do sol. Eu quero o ouro verdadeiro - e mais. Por isso faço ciência - que não explica tudo, mas que quando bem usada, não cega.

(imagem: detalhe da Capela Sistina - fresco Criação do sol e da lua - usado no verbete Deus da wikipedia, Deus esse que pode ser escrito, em uma deformação do hebraico, como Eloá)

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