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Mas, como todo imbecil, minha vida é absolutamente inútil e desinteressante (e não tem sexo). Minha vida é o resultado de uma seqüência de armadilhas que me prenderam uma a uma. Estou preso, e "agora já fugiria de mim se de mim pudesse." Que me resta, senão escrever, declamando a minha versão - pobre, é claro - do mal do século ("culto do egocentrismo, vazado de melancolia e pessimismo")? É isso mesmo: na verdade, como todo imbecil, sou muito apegado ao romantismo... Adoro poesia - e só tento fazer ciência (meu fator h é bem pequeno mesmo...) por ver poesia nela, o que é só mais um sintoma.
Enfim, se tivesse coragem eu escreveria contos e versos mas, pensando bem, para quê? Álvares de Azevedo ("A vida é um escárnio sem sentido. Comédia infame que ensangüenta o lodo") e Augusto dos Anjos ("Vês! Ninguém assistiu ao formidável/Enterro de tua última quimera./Somente a ingratidão - esta pantera -/Foi tua companheira inseparável!") já disseram tudo que eu poderia dizer como escritor e poeta.
Preso a mim e ao hoje, empurro os dias com a barriga, mas, imbecil, continuo sonhando: "você me prende vivo, eu escapo morto."
(imagem: Hamlet contemplando Yorick e dizendo "Que fizeram de teus sarcasmos? De tuas cabriolas e canções? De teus rasgos de bom humor que faziam sorrir toda a mesa? Nem um só gracejo agora para zombar de tua própria careta? Nada?")
6 comentários:
Talvez eu possa, também, a partir de algumas semanas, passar a ver poesia na ciência, na crueza das relações humanas e na vida em geral. Patético é quem vive anestesiado e não sente o gosto do verde, o cheiro da chuva e o som do pôr-do-sol.
Caro Dedalus,
Sua inteligência é notável assim como o seu pessimismo....
Você poderia deixar Álvares de Azevedo de lado e citar algo como:" O amor é a coisa mais fácil, o amor é a coisa mais difícil o amor é o que mais quero" ADÉLIA PRADO
Caro Rafael,
Adorei o que você escreveu, mas "living is easy with eyes closed, misunderstanding all you see" (trechinho de Strawberry Fields, música dos Beatles, que diz mais ou menos "viver é fácil de olhos fechados, não entendendo nada do que se vê"). Eu sinto um pouco do que você descreveu, mas continuo anestesiado: fazer o quê?
Cara Ruth,
Agradeço imensamente o elogio, mas, parafraseando o escritor americano Mark Twain, devo declarar que "notícias sobre minha inteligência são extremamente exageradas". Quanto ao amor, o que você acha que pode deixar alguém que se declara adepto do romantismo tão pessimista? Segue mais uma citação: "love does not make fools, but exposes them" (numa traduçao rápida, "o amor não gera tolos, mas os expõe"; o interessante é que essa frase que eu aprendi sei lá quando NÃO EXISTE na todo-poderosa internet...)
Um abraço!
Dedalus
Ok,não vou discutir sobre sua inteligência...
mas quanto à: exposição, amor e tolice,devo dizer que o amor ixige sim exposição e declaração.Exageradas e tolas(ainda bem que as serenatas desapareceram...
Qual tempo histórico potencializa mais a exposição que o nosso?Conhecemos a vida privada dos outros através de blogs....
Uma citação interessante: "Se nada amássemos, nem a nós mesmos, nossa vida seria mais tranquila do que é. Mas é que também já estaríamos mortos."( André C. Sponville)
Um abraço
Ruth
Cara Ruth,
Me permita discordar, mas não creio que o amor exija coisa alguma: pode-se amar alguém desinteressadamente, às escondidas. O que requer exposição e declaração é o amor com desejo de ser correspondido... Quanto a um blog ser um modo de conhecer a vida privada dos outros, não se engane: um blog é só uma janela na frente da qual só se põe o que se acha interessante que os outros vejam - você já viu alguma foto minha? Finalmente, obrigado pela citação.
Um abraço!
"Desejar é tudo possuir é nada...
Você parece concordar com Sthendal..
Essa discussão poderia prosseguir indefinidamente...mas por hora gostaria de encerrá-la por aqui.Obrigada pelo alto nível do debate.Um abraço.
Ruth
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