sábado, 24 de maio de 2008

A máquina do tempo


Para quem não sabe, "A máquina do tempo" é o nome de um romance escrito pelo britânico Herbert George Wells (mais conhecido como H.G. Wells) - o mesmo autor de "Guerra dos Mundos" - em 1895. Nesse livro, o personagem principal inventa uma máquina que o leva até o ano 802.701, quando a humanidade está dividida entre os Eloi, "herdeiros" dos aristocratas atuais, e os Morlocks, que são nada mais nada menos que operários embrutecidos.

Bem, esse livro de Wells, junto com "Admirável Mundo Novo", de Aldous Huxley (1932), "1984", de George Orwell (1949) e "Fahrenheit 451", de Ray Bradbury (1953), se enquadra na categoria de distopia, isto é, um tipo de ficção científica que apresenta o mundo do futuro como uma cópia caricatural, exagerada em algum ponto desagradável, do mundo presente.

Esses livros todos citados acima viraram filmes - foram adaptados para o cinema - mas há um filme que parece retomar o tema deles todos numa forma de sátira mais moderna: "Idiocracia", de Mike Judge (o criador de Beavis e Butt-Head). Em "Idiocracia", a premissa inicial é que, sem grandes predadores ou problemas de sobrevivência, a espécie humana estaria sujeita a uma pressão seletiva apenas por competição dentro da espécie, o que não levaria mais a um aumento da inteligência média dos seres humanos, mas favoreceria os que se reproduzem mais, que seriam os menos inteligentes.

Em resumo, o cenário sombrio - e satírico - construído no filme é composto por exageros em relação ao que se vê hoje: as pessoas como consumidores cada vez menos exigentes - e menos capazes. Não sei se é verossímil, mas parece...

Deixa eu me estender um pouco mais: não vi comentários sobre esse filme nos jornais ou na TV, e só o encontrei na internet. Aparentemente, alguns executivos americanos não gostaram da reação que o público poderia ter, ou vestiram a carapuça... Na verdade, a internet parece ser o reino da mediocridade - eu mesmo já escrevi sobre isso. E achei o filme fuçando em postagens falando sobre os padrões de consumo de informação na internet, padrões que realmente deixam uma pulga atrás da orelha: "um post sobre o RBD ou BigBrother ou Sibultramina gera muito mais retorno do que um post trabalhado, original e bem-escrito sobre um assunto que não esteja na moda".

No entanto, não são apenas os padrões da internet que levam a pensar: os padrões gerais, atualmente, são inquietantes. Nos EUA já houve várias discussões sobre a "inflação de notas", relacionada a um relaxamento dos padrões acadêmicos. E - opinião pessoal - não é difícil notar algo parecido em relação à ciência atual: é muito mais fácil publicar um artigo mediano (ou até mesmo medíocre) sobre algo que está na moda do que publicar algo mais sofisticado, mas que levante questionamentos.

Eu já tive um artigo rejeitado com a resposta de que minha primeira equação - uma integral - estava errada. Bem, eu fiz a integral manualmente, numa folha de papel, e me certifiquei dezenas de vezes de que ela não estava errada. Assim, fui checar com um software bastante popular e - surpresa! - o resultado parecia diferente. Parecia, mas não era: umas poucas transformações e os dois resultados, o meu e o do software, coincidiam. Aparentemente, o árbitro do trabalho usara o software e não conseguira ver a equivalência dos resultados. Respondi isso ao editor da revista e a resposta que recebi foi genial: meu artigo, embora sem erros, não podia ser aceito por ser "controverso". Oras, mas não é da natureza da ciência haver controvérsias? Aparentemente, não.

Enfim, muito mais recentemente, notei que duas críticas que recebi a um artigo meu estavam simplesmente erradas. Quando recebi a primeira crítica, errada, enviei minha réplica para o editor da revista a que eu havia submetido o artigo, que, a meu pedido, enviou o artigo para outro revisor. Esse segundo revisor concordou que o primeiro estava errado, mas fez uma outra crítica, também sem fundamento. No entanto, a revista simplesmente me disse que eu não podia recorrer dessa segunda crítica, e o artigo não podia ser aceito já que ele já havia passado por dois revisores que o rejeitaram, ou seja, mesmo que o segundo revisor também estivesse errado a revista não iria publicar meu trabalho. Interessante, não?

Acho que é por isso que prefiro me dedicar, hoje, um pouco mais à ecologia do que à física e às integrais inacabadas, pois só em ecologia se pode escrever um artigo mostrando a relação entre baixa produtividade científica e alto consumo de cerveja... Saúde!

(imagem: um buraco de minhoca, algo que em tese poderia ser usado como uma máquina do tempo)

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