sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Sutil é o Senhor...


Há lugares em que provavelmente nunca porei meus pés - um deles acho que é a África. Não tenho nada contra o continente, mas não consigo imaginar nenhum motivo para me aventurar por lá, nem mesmo uma Copa do Mundo...

Sou um cientista (ou uma imitação barata de um) teórico, e meu assunto de interesse principal é a física. Na física, em geral, a geografia tem pouca - talvez, na verdade, nenhuma - importância. Um físico teórico quer saber de coisas - leis, teorias - que valem em qualquer lugar, não da Terra, mas de preferência, do universo.

No entanto, a África pode ser encontrada na história recente da física. Em 29 de maio de 1919, cerca de uma no após o final da Primeira Guera Mundial, haveria um eclipse visível numa faixa que atravessava o Oceano Atlântico - oportunidade ótima para se testar a nova e revolucionária teoria da relatividade geral, de Albert Einstein, que previa que a presença de um corpo com muita massa, como o Sol, seria capaz de deformar o espaço, de modo que até mesmo a luz das estrelas seria desviada de seu caminho normalmente retilíneo, e esse desvio poderia ser medido comparando-se a posição das estrelas no céu à noite, sem o Sol, com a posição delas na presença do Sol, no céu escuro de um eclipse.

Uma equipe comandada por um astrônomo inglês, Arthur Eddington, escolheu duas posições para ver o eclipse: a "isolada cidade de Sobral, no estado do Ceará", e a "ilha do Príncipe, uma colônia portuguesa um grau ao norte do equador, na costa atlântica da África" (estou citando trechos do livro "Einstein", de Walter Isaacson). Eddington foi para esse último lugar e as fotos do céu que ele tirou, embora não muito boas, quando em conjunto com as fotos tiradas no Brasil permitiram que se confirmasse a previsão da teoria da relatividade.

Einstein ficou famoso no final do ano, com o anúncio oficial dos resultados, mas antes disso casou-se com sua prima Elsa em 2 de junho de 1919 (pelo menos segundo o livro de Abraham Pais, "Sutil é o Senhor..."), apenas poucos dias depois do eclipse, convicto de que sua teoria era boa: ele teria dito a uma aluna,"Eu sabia que a teoria estava certa", e quando ela lhe perguntou o que ele faria se os experimentos não tivessem comprovado a teoria, ele teria respondido: "Aí eu teria pena de Deus nosso Senhor; a teoria está certa".

Enfim, até hoje, acho que nenhum africano ganhou algum Prêmio Nobel, mas a ciência independe de fronteiras - em tese, pode-se fazer ciência na África ou em cantos isolados como Sobral. Basta querer e, é claro, ajuda ter algo como a mente de um Einstein.

(imagem: um eclipse, pintado no século XVI; essa postagem tenta fazer parte de uma blogagem coletiva sobre a África)

3 comentários:

lola aronovich disse...

Dedalus, amanhã respondo um comentário que vc deixou faz um tempão no meu blog. Eu tardo mas não falho...

Anônimo disse...

Caro Dedalus

Cohen-Tanoudji é Argelino.

Agora se vc estiver falando da Africa sub-saariana creio que não há nenhum Nobel em física, mas há Nobel da Paz que creio ter maior valor.

Oxalá tenhamos um premio Nobel da Paz antes do de física.

Abraço

Dedalus disse...

Caro anônimo,

Obrigado pela correção: já fiz uma espécie de mea-culpa numa postagem mais recente...

Um abraço!