domingo, 29 de novembro de 2009

Era dos extremos



Outro dia, em setembro, a capa da revista Superinteressante destacava uma reportagem apresentando nova visão da Segunda Guerra Mundial. Nova visão? Como assim? De acordo com a revista, "Novos dados e documentos estão reeescrevendo a história do maior conflito da humanidade. Pra começar, agradeça aos comunistas por nos livrarem de Hitler."

Para o brasileiro médio, educado pela cultura cinematográfica dos Estados Unidos, pode parecer chocante ouvir que não foram os americanos que derrotaram Hitler. Para mim, leitor de Hobsbawm, a história é mesmo outra, há muito tempo.

Eu lembrei disso, em parte, por estar presenciando, na universidade onde trabalho, uma campanha eleitoral para reitor. E também por conta de uma discussão envolvendo uma acusação contra o presidente Lula, acusação surgida num texto escrito por alguém que disse que ouviu isso e aquilo, e que outros dizem que não foi bem assim.

Adeptos de um certo relativismo cultural e histórico gostam de afirmar que não há fatos, mas sim versões. Eu não sei se concordo, mas sei que há mesmo, muitas vezes, interesse em se contar diferentes versões de um mesmo acontecimento. Por exemplo, sai a notícia de que o político X foi flagrado, em vídeo, recebendo dinheiro vivo. O político X, em sua defesa, diz que recebeu o dinehiro, mas não era nada escuso: era para comprar panetones na campanha, ou coisa do tipo. Em quem se deve acreditar? Qual versão é a verdadeira?

Não sou dono da verdade. Mas sei de algumas coisas. Em geral, posso descrever bem alguns acontecimentos de que participei. Sei dizer o que eu comi no café da manhã, por exemplo; talvez minha esposa, que mora na mesma casa que eu, não saiba. Mas talvez eu não queira que ela saiba que eu flertei com a empregada (em tempo, para não assustar meus leitores: eu não tenho empregada!).

Enfim, há interesses e interesses. Me lembro que, com menos de dez anos, ao descobrir que todo mundo era interesseiro, egoísta e individualista por natureza, eu fiquei chocado. Só que, é claro, o choque existiu por eu não me considerar interesseiro, egoísta e individualista: eu esqueci, de propósito, que tinha o interesse de me mostrar a mim mesmo como mais bonzinho que o resto das pessoas.

Moral: sempre é bom andar "cum grano salis". Ceticismo faz bem à saúde, mas sal demais também causa hipertensão.

(imagem: um saleiro - "Vós sois o sal da terra. E se o sal perder sua força, com que outra coisa se há de salgar? Para nada mais fica servindo, senão para se lançar fora e ser pisado pelos homens." (Mateus, 5:13) )

Nenhum comentário: