quinta-feira, 16 de agosto de 2007

O mundo assombrado pelos demônios

Eu tenho uma conta de e-mail gratuita, num grande portal da internet. Passando por lá, para ler minhas mensagens, não pude deixar de notar uma enquete que aparece no canto de um blog anunciado na página principal do portal:

"Qual é a pior frase sobre o Brasil ?
O Brasil não tem nada. O Brasil é isso aí. (FHC)
O Brasil não é um pais sério. (De Gaulle)
Desta terra eu não quero nem o pó. (Carlota Joaquina)
Esse é o lugar mais nojento em que estivemos. E o Brasil? Depois do Brasil. (Lisa e Bart Simpson)"

Não voto em nenhuma delas, mas as achei interessantes como exemplo de frases provocativas, apenas isso.

Quanto as citações de frases, procurando na internet pode-se achar milhares delas. Os textos na nternet, em geral, são isso: bricolagens de frases - e idéias - alheias. Na internet parece que muito pouco se cria, e muito se copia. Por exemplo, recebi ontem uma mensagem dizendo que no final de agosto o planeta Marte estará tão grande quanto a Lua cheia. É, obviamente, um hoax, uma notícia falsa, divulgada por parecer interessante e pelo hábito que as pessoas criaram de usar a internet para divulgar qualquer coisa, sem se preocupar muito com sua autenticidade ou verossimilhança.

Já recebi várias mensagens divulagndo boatos. Outro dia, recebi uma mensagem linda, falando sobre um pintor, Albrecht Dürer, que, sendo pobre, teria se tornado pintor graças ao sacrifício de um amigo. Achei a estória tão bonita, mas tão bonita mesmo, que me pareceu falsa. Fui investigar, usando o Google, e descobri que há pelo menos duas versões da estória - numa é um amigo que sacrifica por ele, noutra é seu irmão - mas em ambas eles vêm da pobreza e apenas Albrecht se torna um pintor. O problema é que, aparentemente, Albrecht Dürer nunca foi pobre: seu pai era um ourives que depois se tornou dono de muitas gráficas, sendo, de acordo com a Wikipedia em inglês, o mais bem-sucedido editor na Alemanha da época.

Minha investigação no Google me levou a perceber que a estória da pobreza de Dürer aparece ligada principalmente a sites de fundo religioso. Aliás, quem me mandou a estória foi uma pessoa religiosa. Faz sentido: para os religiosos é interessante ter estórias 'reais' de fundo edificante, com uma moral bonita. Já ouvi muitas dessas estórias e, como essa de Düreer, elas me parecem, hoje, bonitas demais para serem verdadeiras. Outra coisa interessante sobre os religiosos é que eles são pessoas que 'querem acreditar' - gosto do som do termo em inglês para isso: gullibility. Só que a credulidade dos religiosos é humana: eles acreditam prontamente em estórias que os agradam, que acariciam somente aquilo em que eles querem acreditam, e não em qualquer estória.

A briga dos religiosos com a evolução é essa: a evolução parece lembrá-los de que eles são - nós somos -, antes de tudo, animais, e os religiosos, especialmente os cristãos, não querem ser lembrados disso. Eles preferem acreditar que Deus os criou à sua imagem e semelhança, preferindo, provavelmente, a ilusão ao invés da realidade. Qualquer um ou coisa que lhes contradiga é um servo do demônio ou uma mentira criada pelo demônio.

Mas o mesmo ocorre também com os não-religiosos, pois também eles têm demônios. Todos temos preconceitos, e o que reforça nossos preconceitos e nossos gostos pessoais é facilmente abraçado por cada um de nós. Ilusões, adoramos viver de ilusões, já que a realidade geralmente não é do jeito que gostaríamos que ela fosse. Não é a toa que, em algumas vertentes do budismo, o que mais se parece com o diabo cristão é Maya, que pode ser descrito como a divindade das ilusões.

O que é real? Não sei, mas busco - e oro para que minha busca não seja em vão.



(imagem: Mãos em prece, de Albrecht Dürer)

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