sábado, 11 de agosto de 2007

O retrato de Dorian Gray

Após outra semana em que aprendi um pouco mais como os seres humanos se relacionam, não sei ao certo o que escrever. Os termos que vêm à minha mente surgiram numa conversa de ontem, sem serem ditos por mim, descrevendo os eventos da semana: "vilania", "má fé"...

O poder: humanos lutam pelo poder e seus benefícios. Animais sociais agem assim. Mas os humanos tentam se justificar, racionalizando atitudes que são simplesmente egoístas. Eu, à margem, apanho atitudes e discursos, e descubro, sem grandes esforços, nas entrelinhas, falsidade e hipocrisia. E é assim que somos imagem e semelhança de Deus? Não, nós não temos nada a ver com Deus: somos puro pó e sujeira.

Há muitos anos, na casa de meus pais, me vi, numa madrugada, observando um trio de gatinhos brincando na sala. Ali, senti uma graça e uma leveza que reencontrei muitas vezes depois, em pombos numa praça, num boto que vi no Araguaia, nos pardais vagabundos da rua de minha casa, numa árvore, num inseto, no céu estrelado, numa flor, numa idéia. Beleza em uma forma impossível de se registrar por completo, seja em filmes ou livros ou qualquer forma. Beleza apenas.

Eu tenho um filho de dois anos. E nele de novo me espanta reencontrar essa beleza nobre e simples que vi nos gatos naquela noite. Sua inocência me comove até quase as lágrimas. Sua pureza infantil, presente em cada cachinho de seus cabelos, me assombra. Onde eu e os outros nos perdemos, que já não somos mais assim? Como nós, homens e mulheres, nos tornamos criaturas tão feias e odiáveis?

Na casa de meus pais, hoje, não há gatos. Na parede da sala se destaca uma grande foto minha, tirada quando eu tinha três ou quatro anos de idade: eu, de cabelos longos e lisos, vestindo uma blusa que hoje quem usa é meu filho. Que Deus não permita que ele se desfigure tanto como eu, nem tanto quanto meus contemporâneos.

(imagem: Madonna, de Correggio)

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