segunda-feira, 19 de julho de 2010

Moving waves


Há deslizes que parecem imperdoáveis, por serem de proporções monumentais. Os famosos "atos falhos", por exemplo, podem se encaixar nessa categoria:
"Um ato falho, ou tecnicamente parapraxis, é um erro na fala, na memória, ou numa ação física que é interpretado como ocorrendo devido à interferência de algum desejo, conflito ou linha de pensamento inconsciente ("dinamicamente reprimido", muitas vezes sexual)."
O que me incomoda nessa frase é a palavra "interpretado": nem tudo precisa ou pode ser interpretado (e, bem, eu não concordo que tudo tenha fundo sexual). Só que a maioria das pessoas - eu, inclusive - quer ver significados em tudo, e assim é fácil esquecer que muitas vezes, um charuto é só um charuto. Sorte que alguém na wikipedia lembrou disso:
"Em contraste com Freud e seus seguidores, os psicólogos cognitivos afirmam que deslizes linguísticos podem representar um conflito de seqüenciamento na produção da gramática. A partir dessa perspectiva, deslizes podem ser devidos a subespecificações cognitivas que podem assumir uma variedade de formas - desatenção, dados sensoriais incompletos ou conhecimentos
insuficientes. Em segundo lugar, podem ser devidos à existência de algum padrão de resposta adequado a nível local que é fortemente condicionado pelo seu uso anterior, ativação recente ou alteração emocional ou pelas condições de chamada da situação (...). Em outras palavras, [nesses casos] os erros foram devido à substituição de hábitos fortes."
Eu tenho um milhão de hábitos, alguns bem antigos, já que sou um cachorro velho, que demora a aprender truques novos. E um que eu já devia ter aprendido há bastante tempo é o de ter muito cuidado com coisas delicadas.

Eu escrevo tudo isso porque ontem eu, por conta de "hábitos fortes", quebrei um diamante, e hoje sinto ainda os cacos dele na minha mão, debaixo das minhas unhas, piores que farpas de madeira. O pior de tudo é sentir não haver o que fazer: parece que não há cirurgião que retire esses pedaços da minha carne e, especialmente, parece não existir cola ou técnica que remonte o que eu quebrei.

Eu me sinto como Orfeu, que foi até o inferno resgatar a quem ele amava, e que já na saída com ela cometeu o único erro que ele não podia cometer...

(imagem: Orfeu; o título desta postagem vem de um álbum do grupo de rock progressivo Focus, que tem uma música de dezesseis partes chamada "Eruption", sendo que uma delas é "Orfeus")

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