sábado, 28 de julho de 2007

A arte de escrever


Tive uma semana complicada, cheia de surpresas. As maiores aconteceram justo na sexta à noite, quando tive de ir a um pronto-socorro. Em casa, mais tarde, na cama, ante o sufoco do primeiro set do jogo de vôlei entre Brasil e Venezuela pelo Pan-americano, desliguei a TV e fui tentar acalmar a mente lendo um livro que, por acaso, me encontrou no Carrefour. No papel, antes adormecidas, esperando por mim, as palavras vieram como um soco:

"Diletantes, diletantes! - Assim os que exercem uma ciência ou uma arte por amor a ela, por alegria, per il loro diletto, são chamados com desprezo por aqueles que se consagram a tais coisas com vistas ao que ganham, porque seu objeto dileto é o dinheiro que têm a receber. Esse desdém se baseia na sua convicção desprezível de que ninguém se dedicaria a um assunto se não fosse impelido pela necessidade, pela fome ou por uma avidez semelhante. O público possui o mesmo espírito e, por conseguinte, a mesma opinião: daí provém seu respeito habitual pelas 'pessoas da área' e sua desconfiança em relação aos diletantes. Na verdade, para o diletante, ao contrário, o assunto é o fim, e para o homem da área como tal, apenas um meio. No entanto, só se dedicará a um assunto com toda a seriedade alguém que esteja envolvido de modo imediato e que se ocupe dele com amor, con amore. É sempre de tais pessoas, e não dos assalariados, que vêm as grandes descobertas."

Li isso tarde demais... Eu até conhecia o autor, Schopenhauer, mas não esse texto, saído de Parerga und Paralipomena (aparentemente, segundo o tradutor, algo como "Acessórios e remanescentes"). Pena: agora já me defini como um "diletante profissional" (está lá no perfil disponível no blog desde sua criação). O que eu faço sendo tamanha contradição?


Amo a ciência e o conhecimento acima de tudo, mas como assalariado, preso hoje a uma rotina de trabalho e família e vida social, não consigo me imaginar, hoje, fazendo a mais leve descoberta, quanto mais as grandes: não sou nenhum gênio. Quanto à maioria das descobertas dos homens de área e de gênio que são meus contemporâneos, não me entusiasmo muito por elas, e por isso não consigo imitá-las ou seguí-las: me parece algo como ficar andando em círculos sobre caminhos já demarcados, apenas para poder dizer que se faz algo. E - sei muito bem - por causa disso sou visto por boa parte de meus colegas como um mero diletante, um incapaz ou inútil que por sorte conseguiu um emprego - às vezes, até mesmo eu concordo com eles.


O que fazer, meu caro, Schopenhauer, com toda a minha vontade de conhecer? Eu queria ter respostas para desvendar os céus e abrir até mesmo os portões do inferno, e me esforço para encontrá-las (tive, recentemente, vários problemas de saúde por estresse), mas por ora só tenho palavras, as suas e as minhas: o amor, por o que quer que seja, qualquer que seja, pode muito pouco.


(imagem: Signboard for a Schoolmaster, pintura de Ambrosius Holbein, que serve de capa para o livro A arte de escrever, de Arthur Schopenhauer, numa edição de 2007 da editora L&PM.)

Nenhum comentário: