sexta-feira, 16 de abril de 2010

A arte de amar a ciência


Ah! A ciência e seus frutos... É fantástico ver os resultados da atividade científica, quando eles já estão prontos de verdade: é um pouco como ver uma jóia, feita de ouro e brilhantes. No entanto, antes disso, antes da "verdade" se revelar, alguém tem de fazer o trabalho de garimpagem...

Tudo começa, às vezes, no meio de mais um dia comum, quando seus olhos, como numa visão, encontram uma idéia que parece perfeita para você, lhe prometendo o mundo e mais um pouco, ou o seu pequeno punhado de glória. Aí, já maravilhado, você vai atrás dela, para confirmar se o que você sentiu é real ou só uma ilusão atraente. É um jogo de sedução, uma dança que pode ser longa e levar quem entra nela numa montanha-russa de emoções.

Acho que foi quase ontem, ou uns poucos dias atrás, que eu tive um instante assim, em que eu achei que tinha visto algo tão poderoso que quase não pude acreditar: era como se eu tivesse encontrado a pedra filosofal, ou o Santo Graal. Fiquei num estado de euforia, apaixonado. E como todo apaixonado perdi o sono e a fome acariciando minha idéia: "e se eu fizer isso?", "e se eu fizer aquilo?", "será que..." Em reuniões administrativas, em colegiados, em conselhos, eu não conseguia me concentrar em nada mais, nem mesmo na preparação de aulas.

Mil passos de dança depois, ainda não sei se achei alguma coisa ou se fui me meter em apenas mais um beco sem saída, e eu não sei como continuar. Hoje, pouco depois do almoço, fiquei profundamente deprimido, me sentindo talvez o maior imbecil da Terra, frustrado como se eu tivesse sido rejeitado. No fim do dia, quando eu já estava saindo de minha sala, pronto para me esconder no ponto mais profundo do planeta, para talvez nunca mais sair de lá, fui surpreendido por uma nova, ainda que breve e fugaz, lufada de esperança, que me fez ficar por mais algum tempo em frente ao computador.

Por que eu me meti nesse negócio? Seria muitíssimo mais simples deitar sobre o que eu já aprendi e dar aulas até a aposentadoria. Mas eu sei que não sou uma criatura puramente racional, e que a ciência, a bela ciência, aquela que é mais que burocracia e geração de estatísticas, não é feita de modo racional: ela é como uma declaração de amor, e é algo que eu ainda não vejo direito como fazer...

(imagem: pintura de Jan Vermeer, intitulada "A carta de amor", cujo simbolismo é interessante; o título desta postagem vem de um livro de Pascal Nouvel, descrito como "uma análise sobre as motivações e caminhos que conduzem os cientistas às suas descobertas, percurso ambivalente, entre a lógica do método científico e as razões subjetivas, psicológicas e pessoais, que levam tais pessoas a se dedicar à ciência")

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